Os cabelos são compostos majoritariamente por proteínas. As proteínas possuem caráter anfótero, ou seja, acima de certo pH apresentam carga negativa (caráter aniônico) e, abaixo, positiva (caráter catiônico). Esse “pH limite” é chamado de ponto isoelétrico, que é o ponto no qual a carga é nula. Cabelos saudáveis apresentam ponto isoelétrico ao redor de 3,67, portanto, em condições normais, os cabelos possuem caráter levemente aniônico, já que o pH da superfície dos cabelos varia de 4,5-5,0. Nessa condição de equilíbrio é que eles se mantêm mais resistentes, com brilho e maciez. E é justamente para ajudar a manter esse equilíbrio que devemos optar por shampoos, condicionadores, finalizadores, etc…com pH levemente ácido, similares aos cabelos.

Muitas vezes, as águas tanto de piscina quanto de mar podem conter metais pesados, por contaminação ou não (já que eles podem ocorrer naturalmente na natureza). Esses elementos encontram-se como cátions dispersos na água, e por apresentarem cargas positivas, são atraídos pelos cabelos. Para conseguir removê-los, é necessário utilizar alguma substância ou composto de carga negativa, como surfactantes aniônicos (os melhores seriam os sulfosuccinatos e sarcosinatos, que são agentes de limpeza suaves) ou argilas como a bentonita, que atraem facilmente cátions por apresentarem superfície negativamente carregada e elevada capacidade de troca de cátions (no mercado, essa argila é mais conhecida como “argila verde”).

 

ÁGUA DO MAR

O sal da água do mar (em sua maioria NaCl) em si, não interage quimicamente com os cabelos, porém microcristais de sal que se precipitam nos fios após a evaporação da água levam à abrasão mecânica das cutículas (pena que não encontrei uma fotomicrografia mostrando isso!). Por isso que é importante lavar os cabelos com água sem sal após sair do mar. Não havendo essa possibilidade, deve-se tomar cuidado para evitar ao máximo o atrito entre os microcristais de sal e os fios. Em minha opinião, uma alternativa seria passar uma boa dose de creme para pentear (antes e depois de entrar no mar, e desses com substâncias lubrificantes que envolvem os fios, como óleos vegetais e silicones) e fazer um coque fofo (ou outra forma de prender mais suave). É importante lembrar que, além dos cristais de sal, grãos de areia acabam depositando sobre os fios, contribuindo com a abrasão mecânica. Exatamente por causa dessa interação negativa entre sal, areia e cabelos é que torço o nariz para essas esfoliações que muita gente faz com sal, açúcar cristal, etc…se eu resolvesse fazer uma esfoliação, seria somente com o uso de argilas, que possuem partículas extremamente pequenas, tanto é que são consideradas partículas coloidais. Para quem tem cabelos finos como eu, toda precaução é bem-vinda hehe!

É importante lavar os cabelos com água sem sal após sair do mar. Não havendo essa possibilidade, deve-se tomar cuidado para evitar ao máximo o atrito entre os microcristais de sal e os fios, passando uma boa dose de creme para pentear.
ÁGUA DA PISCINA

O maior vilão, por menos que pareça, é o cloro presente nas piscinas. O cloro é altamente reativo, assim, reage com as células das cutículas dos fios, degradando e dissolvendo proteínas. Em consequência disso, há a formação de bolhas de proteínas (“allworden sacs”) ao longo dos fios devido à dilatação das membranas das cutículas. Essas bolhas acabam se rompendo e tendem a se enroscar em escovas e pentes, gerando severas fissuras nas cutículas e pontas duplas (e múltiplas!), danificando e enfraquecendo os cabelos. Essa reação não é instantânea e ocorre mais rapidamente quando há excesso de cloro na piscina.

É chocante, mas este é o efeito do cloro nos fios…os temidos “allworden sacs”! :O

Assim, é muito importante proteger ao máximo os cabelos da ação do cloro, utilizando-se um creme ou leave-in com compostos capazes de enluvar,

encapar os fios. Os óleos vegetais são uma ótima opção. Eu, particularmente, prefiro utilizar um leave-in com óleos vegetais e silicones insolúveis em água. Os silicones insolúveis não acrescentam nada demais aos cabelos, mas o fato deles encaparem os fios e serem resistentes à água já serve como uma ótima proteção. Não utilizo nenhum produto lotado de silicones, mas gosto deles em pequenas quantidades no dia-a-dia (não em finalizadores, só em condicionadores) e em moderadas quantidades como proteção contra o sal da água do mar e o cloro da água da piscina.

A linha Onde o Cloro não tem vez da Lola é rica em extratos e óleo vegetal, formulada para proteção contra os danos nocivos do cloro. Acesse: https://goo.gl/W3X6H3

 

ÁGUA DURA

Para finalizar, aproveito para fazer um adendo em relação à remoção de cátions dos cabelos. Quem faz No Poo ou Low Poo e prefere não utilizar surfactantes aniônicos para limpeza dos fios, pode ter problemas em locais onde a água é dura. A água dura é simplesmente uma água em que a concentração de cátions, principalmente Ca2+ e Mg2+, é muito elevada, somados ultrapassando 150 mg/L.

E de onde vem esse povo!?
Por que raios tem lugar em que a água é assim!?!?

Bom, é tudo “culpa” das rochas que o local possui. Consumimos tanto águas superficiais (aquelas encontradas em rios, lagos e até mares) quanto águas subterrâneas (aquelas que se alojam nos poros e nas fissuras das rochas). Essas águas estão em constante contato com as rochas da superfície e subsuperfície terrestre. As rochas são compostas por minerais, e tais minerais facilmente liberam íons quando em contato com a água. A Europa, por exemplo, é rica em rochas carbonáticas, como calcários e mármores, que são rochas constituídas principalmente pelo mineral calcita. A calcita possui a fórmula química CaCO3 e, em contato com a água, libera facilmente cátions Ca2+. Outro mineral comum nessas rochas é a dolomita, MgCO3, que por sua vez libera cátions Mg2+. A liberação contínua desses íons pode levar à saturação da água nos mesmos, tornando-a “dura”! Por isso, quem passa um tempo ou mora em regiões como a Europa, pode sofrer acúmulo dessas pestes nos cabelos.

Possíveis soluções eu já comentei: a aplicação de argila ou uso contínuo de surfactantes aniônicos. Outra, ainda mais prática, é fazer um último enxágue com uma solução levemente ácida, pois ela consegue solubilizar esses cátions, mesmo em concentrações baixas. Aí fica por conta do gosto de cada um: sumo de laranja, limão ou outra fruta ácida; vinagre ou chás ácidos como o hibisco. Para ajustar uma boa medida entre água e substância ácida, eu começaria com um pouco de ácido, aumentando-o caso necessário de acordo com a resposta dos cabelos à solução, pois o exagero no ácido pode ressecar as madeixas. Exemplo, então: começar com 500 mL de água + 1 colher de sopa de sumo de limão. Se não for suficiente, aumentar um pouco e aos poucos. Mas como saber o quanto é suficiente? Basta reparar se os cabelos, quando secos, não estão normais, mas estão ficando opacos, pegajosos, secos, etc.!

FONTES CONSULTADAS:

ROBBINS, CLARENCE. Chemical and Physical Behavior of Human Hair. 5th edition, 724p. 2012.

ROBBINS, CLARENCE. The cell membrane complex: Three related but different cellular cohesion components of mammalian hair fibers. J. Cosmet. Sci., v.60, p.437–465, 2009.

JOHNSON, D.H. Hair and Hair Care. Cosmetic Science and Technology Series. V.17, 369p. 1997.